Após as enchentes em maio de 2024 no Rio Grande do Sul, 9 em cada 10 moradores foram afetados psicologicamente, segundo pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mesmo após a tragédia, qualquer novo sinal de tempo ruim acende um alerta: “será que vai acontecer tudo de novo? Será que com a próxima chuva minha casa será atingida? Posso dormir tranquilamente de noite ou devo ficar atento?”. Esses pensamentos indicam a ecoansiedade, sentimento generalizado de preocupação com eventos ambientais.
De acordo com a Associação Americana de Psicologia, de 25% a 50% das pessoas expostas a um desastre climático têm risco de desenvolver problemas de saúde mental. Mas, no caso da ecoansiedade, não é preciso ser protagonista da tragédia, apenas espectador. Isso porque a condição se manifesta quando a pessoa testemunha, ao vivo, pela televisão ou internet, episódios de destruição. Entre os sintomas, estão a insônia, a falta de ar e a fadiga — sensações que acompanharam Elisa Silva, moradora de Arroio do Meio, no Vale do Taquari, que viu sua cidade natal ser devastada pela força do Rio Taquari nas enchentes do ano passado.
O relato de quem viveu um desastre climático
Elisa teve o nome alterado para preservar sua identidade, mas a história é real e exemplo de como os gaúchos foram afetados. Para ela, falar sobre maio de 2024, mesmo tendo crescido num município com histórico de enchentes, ainda é doloroso. “Senti muita ansiedade, vontade de chorar, um sentimento de luto. Luto por tudo que o Vale perdeu. Uma dor coletiva e, ao mesmo tempo, impotência de não poder mudar essa realidade. Mesmo sonhando em ser mãe, cheguei a falar que não queria mais pensar em filhos de tão assustada que fiquei.”
Além disso, a falta de sinal e comunicação com o mundo durante dias, o bloqueio de vias e a queda de pontes também a afetaram. “Era um sentimento de insegurança e incerteza, de não conseguir chegar ou falar com alguém se fosse preciso. Convivi com a sensação de estar fazendo pouco perto de tudo o que a enchente foi. De ver amigos, família e conhecidos perdendo tudo, junto com o medo de voltar a acontecer”, relata.
Arroio do Meio viveu cenários de guerra após a enchente. Segundo a prefeitura, 90% da população ficou sem acesso a serviços básicos, muitos perderam suas casas e apartamentos e até hoje qualquer previsão de chuva preocupa.
Mas como saber que é ecoansiedade?
A ecoansiedade caracteriza-se pelo sentimento de ansiedade desencadeado por desastre ou problema ambiental, como enchentes, incêndios florestais, animais feridos, poluição do ar e ondas de calor extremo. Pesquisa do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com a Universidade de Oxford e o instituto GeoPoll, aponta que 56% das pessoas pensam nos problemas relacionados ao clima pelo menos uma vez por semana. Por isso, a principal forma de diagnóstico da condição é a relação do sintoma com um acontecimento desse gênero.
Porém, é preciso destacar que nem toda preocupação pode ser classificada como ecoansiedade. Ficar comovido e emocionalmente abalado com episódios difíceis é comum, mas esse problema de saúde envolve sofrimento intenso a partir da sensação de desamparo, desesperança e tristeza. E isso afeta diretamente a saúde mental, pois gera medo constante e impotência, e interfere na rotina mesmo sem risco imediato. Já a preocupação surge de forma proporcional, sem atrapalhar o cotidiano, e tem começo e fim, com intervalos onde a pessoa consegue relaxar.
Ações para controlar a ecoansiedade
Para minimizar os sintomas da ecoansiedade ou ansiedade climática — vocábulo já incorporado pelo dicionário de Oxford como “medo crônico da catástrofe ambiental” —, a orientação é procurar ajuda profissional, acolher os sentimentos e fazer a sua parte para cuidar da Terra. Conscientize as pessoas ao seu redor sobre a importância de dar atenção ao tema; faça atividades sustentáveis, como coletar lixo corretamente, não desperdiçar água e construir uma horta; realize doações a vítimas de desastres; aposte em consumo responsável; e tenha hábitos saudáveis. Aliás, os anseios relacionados ao clima estão conectados com a vontade de ver mudanças no planeta. Conforme a pesquisa de opinião pública People’s Climate Vote, 80% da população mundial espera que os governos tomem medidas mais firmes para enfrentar a crise climática e 86% desejam que seus países trabalhem em conjunto para melhorar a situação. Enquanto aguarda-se por iniciativas maiores, participar de ações ambientais ou adotar pequenos hábitos diários pode ajudar a aliviar a sensação de impotência.
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Referências:
https://www.iberdrola.com/compromisso-social/o-que-e-ecoansiedade
